Viagens mais lentas e caras.
O empresário Markenson Marques, de 47 anos, é um desses sujeitos que parece medir a vida em quilômetros por hora. Proprietário de uma empresa de logística, está diariamente monitorando a distância percorrida por cada um de seus 165 caminhões. O desempenho desses veículos é o mercúrio do termômetro que medirá o faturamento da companhia. Esse é um dos fatores que obriga Markenson a usar 8% de sua receita para pagar o Custo Brasil – termo amplo usado para apontar o recurso extra que um investidor precisa desembolsar para driblar deficiências estruturais, econômicas e burocráticas. Na profissão desde os 17 anos, o empresário é capaz de elencar com calma todos os fatores que contribuem para a conta final mais cara. Um caminhão tem custo fixo de R$ 50 por hora, segundo cálculos próprios da empresa. Portanto, quanto mais lentas forem as viagens, maior o gasto de permanência. Os entraves de deslocamento se acumulam. Devido ao tempo prolongado na estrada, o caminhão precisa de dois motoristas trabalhando alternadamente. A empresa criou a função de condutor “flutuante”, responsável por render um colega que concluiu a jornada de trabalho sem ter conseguido chegar ao destino. Em uma comparação com companhias de transporte europeias, o empresário percebeu que o mesmo modelo de caminhão, transportando a mesma carga, gasta 10% a mais de combustível devido às condições das estradas. E, por causa dos buracos, a carreta brasileira precisa de uma estrutura reforçada em aço, aumentando o peso morto do veículo e diminuindo a capacidade de carga. O dilema do empresário exemplifica um problema estrutural no Brasil. As entidades ligadas ao transporte martelam em uníssono que as condições da rede viária fazem o país perder competitividade e dinamismo no escoamento da produção. É um prejuízo total difícil de calcular, justamente por causa da sobreposição de custos adicionais. A Confederação Nacional do Transporte (CNT) avalia que a carga brasileira chegue ao destino 13% mais cara por causa da infraestrutura viária. 60% das cargas do país viajam pelas rodovias A saúde do setor de transporte no Brasil está diretamente atrelada às condições da malha rodoviária. Cerca de 60% de tudo o que transportamos trafega pelas rodovias, o que torna o país dependente de um modelo que exige alto investimento em manutenção, tecnologia e modernização. Porém o estado geral das vias é inversamente proporcional à sua importância. A Pesquisa de Rodovias, feita anualmente pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), considerada o mais amplo raio-x do setor, mostra um cenário em que a qualidade é uma exceção nas estradas pavimentadas. A edição de 2011, divulgada no último mês de novembro, revela que 57% das rodovias do país foram classificadas como regulares, ruins ou péssimas. Para fazer a avaliação, os técnicos percorrem quase a totalidade da malha pavimentada, avaliando itens como sinalização, geometria e condições do asfalto. O diagnóstico mostra um país ainda dividido entre um eixo Sul-Sudeste costeiro e desenvolvido ante um interior quase isolado. No Norte, por exemplo, as estradas ótimas representam 0,8% da malha da região, ante 23% de trechos péssimos. “Nossa economia está muito concentrada em um canto do país, em uma faixa de no máximo 400 quilômetros do mar. Historicamente, não fizemos um processo de integração industrial do Leste com o Oeste semelhante ao dos Estados Unidos. O nosso foi um movimento basicamente agrícola”, avalia Edson Carillo, vice-presidente da Associação Brasileira de Logística (Abralog). Entretanto as estradas também não acompanharam a expansão da fronteira agrícola. A CNT fez um estudo de caso com um corredor de escoamento da soja. Saindo de Lucas do Rio Verde, concentrador da produção em Mato Grosso, até o Porto de Paranaguá, no Paraná, o caminhoneiro vai passar por uma BR-163 considerada regular em Mato Grosso e boa em Mato Grosso do Sul, até chegar a uma via ótima: a BR-277, no Paraná, que é pedagiada. Em 2010, o Brasil investiu R$ 14 bilhões na malha rodoviária. Um estudo feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e divulgado no fim do ano passado aponta que esse aporte é apenas 20% do necessário para evitar gargalos. “A tendência é que tenhamos Parcerias Público-Privadas, sob pena de o país permanecer nesse marasmo”, analisa Luciano Salamacha, professor de estratégia de empresas e planos de negócios da Fundação Getúlio Vargas. Ainda que as rotas sejam as mesmas, as surpresas são diversas. Em um país com 1,7 milhão de quilômetros de estradas, dos quais pouco mais de 100 mil são pavimentadas, a qualidade da pista se alterna com frequência entre o ótimo e o péssimo, com proporção maior para a segunda avaliação. “Às vezes o caminhão para numa fila, e daí você não sabe quando vai sair”, relata ele. “Não saio muito dos polos de desenvolvimento do país. Mas, ainda assim, em uma viagem pela costa leste sei que vou pegar alguns trechos de rodovia medianos”. Fonte: Site; Jornal Gazeta do Povo, (04/01/2012).